Quem é que consegue viver assim?
- FACES
- 26 de mai. de 2019
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Conversa com um dos Técnicos Superiores do Gabinete de Comunicação da Junta de Freguesia de Carnide
Após o nosso primeiro Pitch, em que apresentámos o projeto Faces à turma, deslocámo-nos à Junta de Freguesia. Aqui pudemos conversar com um dos técnicos superiores do Gabinete de Comunicação da Junta, a quem apresentámos o nosso projeto e com quem discutimos as questões a ele inerentes, desde a questão dos prédios devolutos, ao comércio tradicional, passando pela tão atual problemática da especulação imobiliária.
O primeiro tema abordado foi a questão dos prédios devolutos em Carnide. Uma questão em que, segundo o nosso entrevistado, as maiores responsabilidades recaem sobre a Câmara Municipal de Lisboa. Contou-nos ainda o caso do Carnide Clube, uma coletividade desportiva centenária, com comprovada importância no desporto nacional, que recentemente, correu o risco de ser despejada do edifício onde reside.
São aquelas rendas muito antigas do início de tudo, onde nem sequer se falava de especulação imobiliária como hoje.
O proprietário apercebeu-se da possibilidade de lucro e mandou uma carta para o Carnide Clube, dentro da legalidade, a dizer que o contrato já não ia ser renovado e eles tinham de sair até determinada data.
Aí a Junta interveio, pedimos para que a Câmara fosse envolvida e o que é facto é que eles não saíram de lá. Nós temos este poder, mas lá está, isto não é uma coisa particular, é uma coisa do local. A Junta não tem nada a ver com a direção do Carnide Clube, mas de facto percebemos que aquela instituição é importante para a Freguesia e percebemos também que o proprietário queria vender aquilo e transformar aquilo num outro hotel.
Mais adiante falámos do processo de urbanização que Carnide tem sido alvo nos últimos anos, de como a adição das novas urbanizações, do Hospital da Luz e do Centro Comercial Colombo, valorizaram e fizeram subir os preços da habitação nesta Freguesia.
Carnide tornou-se uma zona nobre da cidade. Que não era, era uma zona rural, era uma zona periférica da cidade. Eu quando comecei aqui na Junta a trabalhar, quando andava a estudar, lembro-me de ir a reuniões e falava de Carnide e as pessoas pensavam que Carnide não era Lisboa e estamos a falar há coisa de 20, 25 anos atrás.
Estas alterações afetaram grandemente a existência de comércio tradicional em Carnide, que foi desaparecendo. Atualmente o que prospera são restaurantes.
Carnide é muito conhecido pela restauração. Mas depois, o pequeno comércio, agora, há muito pouco, há umas merceariazitas… Muito pouco, porque o Colombo veio tirar isto tudo. Estas grandes superfícies, o Continente… nós temos, nesta pequena área de Carnide, um Lidl, temos o Continente do Colombo, o Continente de Telheiras, o Pingo Doce, logo ao lado. Só nesta pequena área temos quatro hipermercados.
Questionámos então o nosso entrevistado, sobre se haveria realmente alguma pertinência na nossa proposta de transformar os prédios devolutos em comércio.
Eu neste momento não sei. As pessoas mais velhas queixam-se muito dessa falta. Porque, lá está, a população também está a envelhecer bastante.
A Padaria por exemplo, tem sempre imensa gente, também é a única, nós não temos aqui nenhuma Pastelaria, portanto eles vendem bolos, no Natal aquilo tem imensas filas. E vai-se mantendo.
Mas eu acho que esta coisa do comércio local, os próprios proprietários depois também não conseguem sobreviver. Como é que eles vão conseguindo sobreviver? Aumentando os preços, porque não conseguem competir com as grandes superfícies.
Abordando a questão do comércio, o nosso entrevistado assinalou a falta de discussão em torno da própria noção de comércio tradicional, um dos temas do nosso projeto. Na sua opinião, escasseia em Lisboa um tipo de comércio mais genuíno, ao invés de um falso gourmet manufaturado para aumentar os preços e impressionar turistas.
No fim, questionámos o entrevistado sobre qual seria, enquanto habitante de Carnide, a sua proposta para a reabilitação daqueles prédios. Não necessariamente em termos de comércio, mas uma reabilitação ideal, que colmatasse uma necessidade real.
O ideal era eles serem recuperados e tornarem-se habitáveis para jovens como vocês, para virem para a cidade. Quando a Câmara Municipal de Lisboa lança concursos das habitações com rendas sociais, as mais baratas são sempre em bairros sociais. Que têm as suas dificuldades, como nós sabemos. Não são nenhum bicho, nós aqui temos dois e não é nenhum bicho de sete cabeças.
Mas para acabar a questão, muitas das rendas nessas habitações são impraticáveis para um jovem que acabou o curso superior e começa a trabalhar, e em 99% dos casos não vai ganhar um ordenado muito alto. Um aluguer de uma casa está a 700 euros, quem é que consegue viver assim?
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